Os “chás” da dependência
By Cláudio

Os “chás” da dependência

Compartilhe

Os “chás” da dependência

Ao longo de muitos anos trabalhando com dependentes químicos foi possível perceber que a única forma de superar o vício é através da radicalização. Querer “negociar” com a droga não funciona para o adicto. Os Alcóolicos Anônimos ao longo dos seus mais de 90 anos afirmam com convicção: “Evite o primeiro gole e frequente as reuniões”. Para este grupo não existe meio termo, ou seja, ou você está sóbrio ou recaído.

Infelizmente, a grande maioria de todos os dependentes sonha com a possibilidade de um dia conseguir fazer o uso social da droga. Para isto eles precisam sempre racionalizar o seu uso. A busca de uma justificativa para consumir a droga é uma constante na vida de todos os adictos. Dentre várias iremos destacar aquelas mais comuns. Colocando um pouco de humor no problema tão grave como este costumo chamar estes argumentos como os “chás da dependência”. Vejamos:

1 – O “chá” de só uma: a visão do dependente químico é que a droga não é o problema. Ele tem que aprender a usar e não abusar da droga. Ele precisa aprender a controlar o uso não deixando que o excesso interfira na vida dele. Assim ele acredita que pode tomar só uma dose, cheirar só uma carreira ou fumar só um baseado. O que ele não pode fazer é passar a noite na rua se drogando. Enquanto ele continuar com esta visão, ele vai continuar tendo recaídas atrás de recaídas e, o pior, cada uma dói mais do que a outra. Se ele conseguisse isto, ele já alcançado esta meta, afinal, desde quando ele começou a perder o controle, sempre tentou estas estratégias como fazer o uso só o final de semana, largar as bebidas destiladas e ficar só na cerveja, fazer o uso só dentro de casa, etc. Todas as tentativas tiveram como fim o mesmo: mais um uso abusivo.

2 – O “chá de inha”: é um mecanismo inconsciente onde o dependente utiliza do diminutivo para se sentir superior a droga. Normalmente este “chá” vem servido junto como o “chá de só uma”. Os termos: “só uma cervejinha”, “só um baseadinho”, “só uma carreirinha ou pedrinha” fazem parte do cotidiano do dependente. Este “chá” é o oposto do primeiro passo, ou seja, sua prepotência e arrogância de achar que é superior as substancias psicoativas leva o dependente ao fundo do poço. Quanto mais ele desprezar o poder destruidor das drogas, mais ele vai afundar nelas.

.

3 –O “chá de já tô bão”: o dependente acredita que já está bom e que não precisa continuar seu tratamento. Logo em seguida ele abandona a Comunidade Terapêutica, os grupos de apoio, o médico e o psicólogo. Sem perceber volta à rotina anterior e as recaídas se tornarão frequentes na sua vida. Talvez este seja o “chá” mais conhecido entre os dependentes e familiares. A recuperação física, emocional e mental tão rápida dá a ilusão que ele já esta consciente da sua situação. Ele ainda não entendeu que esta doença é crônica, incurável e progressiva, portanto, o tratamento deve ser constante para os próximos 100 anos da sua vida. Acreditar na cura é uma ilusão que pode levar a um pesadelo sem fim: OUTRA RECAÍDA

4 – O “chá de calcinha ou cueca”: é quando o dependente em processo de recuperação começa a se relacionar afetivamente com alguém que faz uso de drogas. Levado pelo jogo de sedução, ele deixa retornar ao uso da droga por causa do companheiro (a). Por isto, especialmente no primeiro ano de tratamento, o dependente deve tomar o cuidado em relacionar com pessoas que fazem uso de substancias psicoativas e que frequentem ambientes “regado” a estas substancias.

Enfim, vários são os desafios para alcançar a verdadeira sobriedade. Mas sem dúvida alguma o maior deles é a aceitação da dependência química e a sua impotência diante de uma doença tão grave como esta. O dependente precisa entender que a droga não “negocia” com ele, portanto, não dá para ele “negociar” com a droga.

Cláudio Martins Nogueira

Psicólogo Clínico – Especialista em DQ e CODE

  • No Comments
  • 27/01/2025
× Como posso te ajudar?