O acidente da droga
O acidente da droga
Um jovem motoqueiro sofreu um grave acidente. Estirado na avenida estava ali agonizando com sua respiração ofegante, as lágrimas correndo nos seus olhos. Sua dor era tanta que ele não resistiu e logo desmaiou. As primeiras pessoas que chegaram imediatamente chamaram a ambulância para leva-lo para um pronto-atendimento. Chegando lá, o nosso amigo passou pela triagem e foi encaminhado para o bloco cirúrgico. Após a cirurgia que durou algumas horas, devido a gravidade da situação, ele foi transferido para o CTI para que os médicos tivessem condições de acompanha-lo na sua recuperação.
Após alguns dias, ele foi para o quarto e depois de uma semana ele teve alta com várias instruções para o seu processo de recuperação. Consultas regulares ao ortopedista, fisioterapia três vezes na semana, medicação para dor e anti-inflamatórios. Somente depois de três meses de tratamento é que o seu médico lhe deu alta com várias restrições na sua rotina como evitar atividades físicas intensas como correr, jogar bola, etc..
Traçando o paralelo com o ‘acidente’ dependência química é possível verificar algumas semelhanças e diferenças:
- – Desejo de se tratar – ninguém perguntou ao motoqueiro se ele queria ir para o hospital, mesmo porque ele estava desmaiado. No dependente, ele está ‘desmaiado’ na alienação da droga. Em outros termos, ele perdeu sua condição de sujeito capaz de decidir seu tratamento. Alguém tem que fazer por ele ou tem que convencê-lo a se tratar;
- – Grau de comprometimento e de tratamento – Assim como o motoqueiro passou por uma triagem, o dependente também deve passar. A diferença aqui é que no caso do motoqueiro um técnico vai conduzi-lo ao melhor tratamento, enquanto que no caso do dependente químico o próprio doente vai decidir que tipo de tratamento ele vai precisar.
- – O tempo de internação – O médico é que dá alta ao doente acidentado. No caso do dependente químico o próprio doente se dá alta. A comunidade terapêutica apenas indica um tempo padrão de tratamento, mas é ele que decide seu prazo de internação;
- – Após a alta terapêutica – Cumprido o processo de internação o motoqueiro é orientado sobre os cuidados que deve ter com sua saúde. Da mesma forma, o dependente durante todo o processo de tratamento é preparado para o momento de alta. Neste aspecto, ambos aumentam suas responsabilidades sobre o próprio tratamento;
- – E as recaídas – em ambos os casos elas podem ocorrer seja por negligência dos pacientes ou mesmo pela falha no tratamento. Em qualquer situação não nos resta outra saída a não ser buscar o tratamento novamente até a solução do problema. A diferença dos dois é que o motoqueiro vai um dia parar de tomar seus remédios e vai praticamente curar o seu machucado, enquanto que o dependente químico terá que tomar seu “remedinho” nos próximos cem anos da sua vida.
Desta maneira, cabe a família ou responsáveis o compromisso de buscar ajuda no primeiro momento para eles próprios para depois “forçar” o tratamento do dependente. É preciso carrega-lo para a “ambulância” em busca de um tratamento adequado, ou seja, um psicólogo especializado, um grupo de apoio ou mesmo uma internação. O que não se pode fazer é abandonar o acidentado no asfalto.
Cláudio Martins Nogueira
Psicólogo Clínico