Divã V: O Terapeuta e a esposa
Terapeuta:
– Oi querida, o que tem para jantar hoje? Estou exausto, o dia foi longo. Cada paciente que me aparece. Será que algum dia eu vou conseguir fazer esses loucos entenderem que não existe uma única versão das nossas histórias?
Quantos anos de terapia esses lunáticos vão precisar para entender que cada situação tem várias narrativas sobrepostas? Eles não enxergam, por isso que deixam tantos buracos nos relacionamentos. Depois vêm chorar no consultório. Assim esses mentecaptos nunca vão conseguir fazer com que as diversas narrativas dialoguem entre si. Mas e aqui em casa, querida? Está tudo bem?
Esposa:
– Seu filho está enfurnado no quarto de mau humor, não quer papo, diz que a gente nunca vai entender ele. O seu assistente acabou de deixar uma carta de demissão e deixou uma observação: decisão irrevogável.
Seu pai anda fumando escondido, e não é só cigarro, sua irmã encontrou umas ervas na gaveta dele. E quer saber? Eu não aguento mais! Você não liga mais para mim, só pensa nos seus pacientes, nos seus problemas, nos seus pais. Virei invisível na sua vida. Você não gosta mais de mim, virei gorda, feia e desinteressante aos seus olhos. E ainda tem a cara de pau de perguntar se está tudo bem por aqui?
Meu comentário:
Por sermos terapeutas não estamos isentos de problemas emocionais e familiares. Afinal, antes de sermos profissionais, somos seres humanos e assim, carregamos conosco todas as mazelas humanas.
É importante ressaltar também que em casa não é o terapeuta quem fala, mas sim, o esposo ou o pai. Desta maneira, o texto não está correto. Talvez o título mais correto seria “O marido e a esposa”.
Para evitar este diálogo do marido/terapeuta com sua esposa é aconselhável todo terapeuta fazer terapia com um colega de profissão. A esposa precisa do marido. O filho do pai e no caso específico do texto, o pai do filho. Quando o terapeuta leva seus problemas do consultório para os familiares ele comete dois erros graves. O primeiro é que os familiares não estão preparados para ouvir isto. E o segundo, ele negligencia o seu olhar de familiar para a sua família.
Assim, o profissional que esteja atendendo o casal deve ouvi-los em separado e o orientar o colega sobre isto, enquanto no atendimento da esposa, procurar fazer exatamente o que o marido procura fazer com seus pacientes: escutar a sua dor e ver uma outra versão sobre esta história.
Cláudio Martins Nogueira – Psicólogo Clínico