Casagrande: “Você usa drogas para não sentir dor” – Final
Mania de perseguição
O condicionamento físico dos tempos de atleta ajudou Casagrande, que teve quatro overdoses e nenhuma sequela. Mas ele sentiu diversos impactos emocionais da dependência, incluindo a persecutoriedade —sentimento patológico de perseguição. Quando teve o surto psicótico, em 2007, ele via demônios. Depois, veio a sensação de que as pessoas tentavam atingi-lo, com olhares e palavras, e a impressão de ser seguido. “Eu achava que era real, um complô contra mim. Fiquei muito tempo assim, acontecia de repente.”
Ele Acredita que isso se formou ao longo dos anos, porque vivia receoso: pensava que qualquer carro de polícia o pararia e, por ser uma pessoa pública, temia ser visto usando drogas. “A cocaína com uso excessivo já te deixa muito perto de ter um surto psicótico. Você tá muito louco na rua e a persecutoriedade vem quando você acha que qualquer carro de polícia tá te olhando, todo mundo percebendo.”
Com o tempo e terapia, o tratamento evoluiu. Há muito ele não se sente persecutório, mas, se acontece, consegue perceber os sentimentos logo de início e freá-los. “É doloroso ficar assim, péssimo. Machuca porque você entra quase em um surto psicótico. E como que eu vou falar? Vou dizer: ‘Não posso trabalhar, porque eu estou persecutório’? Não vão nem saber o que é e vão pensar que eu estou usando drogas de novo.”
Não interessa mais o que as pessoas têm nas mãos A Copa do Mundo de 2018, na Rússia, abriu um capítulo importante na trajetória de Casagrande. No dia da final, ao vivo na TV Globo, após a França vencer a Croácia, o então comentarista disse que aquele era o mundial mais importante da sua vida, por ser o primeiro evento totalmente sóbrio e sozinho. Na Copa de 2014, ele ainda bebia e, nas Olimpíadas de 2016, tinha a companhia de psicólogas e da cantora Baby do Brasil, sua ex-namorada.
Chegar sóbrio, permanecer sóbrio e voltar para minha casa sóbrio era o lema. Ele conseguiu e chorou —muitos de nós também, ao assistir ao depoimento.
Ele entendia a dimensão daquilo, mas a ficha demorou alguns dias para cair. Casagrande se sentia estranho, porque notou não se lembrar das mãos de ninguém. “Eu fiquei preocupado, pensando que tinha acontecido alguma coisa comigo. Cheguei ao Brasil e já fui à psicóloga.” Lá, compreendeu o simbolismo. Percebeu que as mãos, que por anos roubaram a sua atenção segurando latinha de cerveja, copo com bebida, drogas, perderam a importância. “Eu tinha mudado o foco, o que as pessoas tinham nas mãos não me interessava mais. Quando ela me falou isso, eu pensei: ‘Nossa, eu alcancei um patamar interessante’.”
Para o Qatar, que sedia a Copa do Mundo a partir de 20 de novembro, Casagrande diz que irá atento, como colunista do UOL. “Eu estou indo confiante, mais tranquilo, mas nunca desinteressado ou despreocupado. As escolhas que eu tenho que fazer lá são as mesmas que eu faço aqui.” Estar sóbrio é uma vitória, talvez uma das maiores em sua vida. E um dos principais trunfos, com certeza, é voltar a compreender o que sente. Boa Copa, Casão….
Fonte: Veja mais em https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2022/08/31/entrevista-casagrande-saude-mental.htm?cmpid=copiaecola